EXERCÍCIOS SOBRE VARIEDADES LINGUÍSTICAS (Língua Portuguesa – Ensino Médio – 1º ano)

Leia os seguintes versos de uma canção de Luís Gonzaga e Zé Dantas.
Vozes da seca

Seu doutô os nordestino têm muita gratidão
Pelo auxílio dos sulista nessa seca do sertão
Mas doutô uma esmola a um homem qui é são
Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão
É por isso que pidimo proteção a vosmicê
Home pur nóis escuído para as rédias do pudê
Pois doutô dos vinte estado temos oito sem chovê
Veja bem, quase a metade do Brasil tá sem cumê
Dê serviço a nosso povo, encha os rio de barrage
Dê cumida a preço bom, não esqueça a açudage
Livre assim nóis da ismola, que no fim dessa estiage
Lhe pagamo inté os juru sem gastar nossa corage
Se o doutô fizer assim salva o povo do sertão
Quando um dia a chuva vim, que riqueza pra nação!
Nunca mais nóis pensa em seca, vai dá tudo nesse chão
Como vê nosso distino mercê tem na vossa mão
1. Percebemos que há dois interlocutores na canção. Identifique com base nos versos:

A. quem fala;

B. a quem o eu que fala na canção se dirige.

2. Para se referir a seu interlocutor, o eu que fala na canção utiliza, entre outros, os seguintes tratamentos: seu doutô; vosmicê; mercê

A. Levante hipóteses: A qual expressão de tratamento da norma-padrão equivale a palavra seu? Em que casos, em geral, essa expressão é utilizada?

B. Discuta com os colegas e o professor: As expressões vosmicê e mercê estão relacionadas com qual expressão do português arcaico?

C. Qual expressão de tratamento é utilizada hoje em dia no lugar de vosmicê e mercê?

D. Observe a evolução histórica simplificada da expressão Vossa mercê: Vossa mercê > vosmicê > mercê > você. Que outras palavras da língua estão nessa mesma linha de evolução?

3. O eu que fala na canção não se expressa apenas em seu nome, mas em nome de toda uma população vitimada pela seca. Indique os itens que, conforme o texto, se referem corretamente a características das pessoas que compõem essa população.

(  ) Trata-se de pessoas que não trabalham e esperam que as autoridades públicas resolvam seus problemas por meio de subsídio financeiro.
(  ) Trata-se de pessoas que, embora miseráveis, mantêm seu orgulho pessoal e querem retribuir por meio do trabalho os benefícios que lhes sejam concedidos pelos governantes.
(  ) Trata-se de pessoas trabalhadoras, que, em razão das condições adversas em que se encontram, não conseguem prosperar apenas por meio da disposição que têm para o trabalho.
(   ) Trata-se de pessoas que vivem na miséria e não têm disposição para trabalhar e, assim, beneficiar a si mesmas e ao país.

4. Sabendo que a canção foi criada em 1953, analise e discuta com os colegas e o professor as afirmações abaixo, a fim de verificar se são verdadeiras ou falsas e por quê.
A. O fato de muitas palavras da canção terem uma grafia não mais utilizada hoje em dia, isto é, correspondente ao português antigo, indica que ela foi escrita há muito tempo.
B. Ainda que tenha sido escrita há mais de sessenta anos, a letra da canção trata de um tema extremamente atual.
C. A letra da canção está escrita em uma variedade não padrão do português e ainda hoje muito presente na fala de um grande número de brasileiros.
5. Observe estas ocorrências: os nordestino, os rio, os juru.

A. Elas exemplificam uma regra própria da fala de algumas variedades do português brasileiro. Qual é essa regra?
B. Levante hipóteses: Em juru, o que explica a troca do o pelo u na segunda sílaba da palavra?
6. Releia as orações:
“os nordestino têm muita gratidão”
“pidimo proteção a vosmicê”
“nunca mais nóis pensa em seca”

A. Reescreva as orações segundo as regras da norma-padrão escrita.
B. Discuta com os colegas e o professor: Quais são as diferenças entre a forma original e a forma das orações conforme a norma-padrão?
C. Observe a concordância entre o sujeito e o verbo em cada oração. Há uma regra comum para as três? Explique como ela é feita em cada uma.
7. Observe os seguintes pares de ocorrências: por / pur, qui / lhe, esmola / ismola, sem gastar / vai dá.

A. Em cada um dos pares de ocorrências, uma é grafada segundo a norma-padrão. Indique as ocorrências que seguem a norma e reescreva corretamente as que não seguem.
B. Levante hipóteses: O que levou à escrita dessas palavras de uma maneira diferente da prescrita pela norma ortográfica?
8. Por ser letra de canção, o texto em estudo circula principalmente por via oral, isto é, ele é mais cantado e ouvido do que escrito e lido. Com base nesse fato e nas respostas às questões anteriores, levante hipóteses:

A. As grafias e as construções que, no texto, estão em desacordo com a norma-padrão devem ser vistas como um problema? Justifique sua resposta.
B. Por que há oscilações entre ocorrências semelhantes, como por e “pur”, “qui” e lhe, esmola e “ismola”, gastar e “dá”?
RESOLUÇÕES:

1:
A) Um nordestino, eleitor, morador de um Estado onde o povo sofre com a seca e que apela por auxílio a fim de conseguir melhorar a situação dos moradores da região (“os nordestino têm muita gratidão”, “pidimo proteção a vosmicê”).
B) A uma autoridade política (“Seu doutô”, “Home pur nóis escuído para as rédias do pudê”).
2:
A) À expressão senhor, utilizada em situações em que se quer demonstrar respeito ou distanciamento em relação ao interlocutor.
B) Vossa mercê.
C) Você.
D) Vassuncê, vancê, ocê, cê.
3:
– Trata-se de pessoas que, embora miseráveis, mantêm seu orgulho pessoal e querem retribuir por meio do trabalho os benefícios que lhes sejam concedidos pelos governantes.
– Trata-se de pessoas trabalhadoras, que, em razão das condições adversas em que se encontram, não conseguem prosperar apenas por meio da disposição que têm para o trabalho.
4:
A) Falsa, pois essa grafia não caracteriza uma época antiga.
B) Verdadeira, pois a letra trata de diversos assuntos atuais: seca, política, pobreza.
C) Verdadeira.
5: 
A) A marcação do plural apenas no primeiro elemento de expressões formadas por artigo e substantivo.
B) A pronúncia, uma vez que no Brasil normalmente se diz juru e não juro.
6:
A) Os nordestinos têm muita gratidão / pedimos proteção a vossa mercê / nunca mais nós pensamos em seca.
B) Na 1ª, o plural em nordestinos; na 2ª, a ortografia e o acréscimo do s em pidimo e a ortografia em vosmicê; na 3a, a ortografia em nós e a concordância verbal em pensamos.
C) Não. Na primeira, o verbo está no plural, concordando com o sujeito. Na segunda, o verbo concorda com o sujeito, mas tem uma grafia influenciada pela fala, diferente da padrão. Na terceira, o verbo está no singular e o sujeito, no plural.
7:
A) por, lhe, esmola, sem gastar / por, que, esmola, vai dar.
B) A influência da pronúncia das palavras, pois ao falarmos é muito comum o e ser pronunciado como i e o o como u e o r final dos infinitivos não ser pronunciado.
8:
A) Não, pois a normapadrão é um modelo, uma referência que orienta os usuários da língua quando precisam usar o português de modo mais formal, o que não é o caso da canção.
B) Porque, tratando-se de uma variedade oral e de pouco prestígio social, não há registros escritos suficientes para que se instituam regras para essa variedade, diferentemente do que ocorre com a norma-padrão.